sábado, 21 de maio de 2011

Quando se tem muito a perder porque não se tem nada


Não são somente as crianças que são invadidas por produtos e engenhocas que garantem prazer instantâneo (veja texto o consumudo x nâo para os filhos). Os adultos também sofrem do mesmo mal e diferente das crianças, muitas vezes ficam aprisionados nesse ciclo de consumo, status e prazer imediato. Preenchem o vazio com coisas.
Tenho uma amiga cujo principal objetivo profissional era conquistar uma gerência na empresa que estava ou em outra. Para ela a satisfação de tal conquista era o principal juntamente com a recompensa financeira que viria. Acreditava que ter um carro melhor, poder viajar muito, morar em um lugar maior lhe traria felicidade absoluta. Hoje ela está questionando tudo isso, está com um cargo de gerência em uma multinacional, trabalha sob muita pressão e percebeu que é a marionete dos diretores, assim como todos os gerentes. Via de regra os profissionais de alto escalão - gerentes, diretores, superintendentes e presidentes têm muito a perder. Seus salários são elevados, os benefícios também e seu padrão de vida tem alto custo. Possuem apartamentos enormes cuja manutenção é alta, carros que andam e falam por conta própria, viagens ao exterior, jantares em lugares caros e da moda, roupas de grife, etc. Tudo isso tem um preço, financeiro e emocional e que em determinado momento perde sentido. Quando percebem que seus cargos estão ameaçados simplesmente passam a bola. Que perca o emprego outro e não eu. Não necessariamente essa pessoa é má, sem valores de coletividade, mas ao longo de tantos anos de vida sustentou seu valor como pessoa, no ter, por isso, para continuar a ser essa pessoa que acredita valorizar e que os outros valorizam precisa manter o status quo. 
Sofrem diariamente com conflitos morais.  Normalmente as pessoas de cargo elevado acumularam bens para satisfazer um desejo imediato, o prazer vem e vai  em pouco tempo. Portanto, na sequência,  precisam preencher o vazio com outra coisa que vem de fora. Defendem seus cargos como feras selvagens, doa a quem doer. Não é bem um estilo agressivo de administração, mas um estilo agressivo de defender aquilo que tem medo de perder.  Certa vez vi um documentário sobre uma tradicional casa de chás do Rio de Janeiro em um nobre (acho que foi no século 17) planejou uma festa e a realizou dentro do período de quase dois anos. Lembro que os cristais vieram da Suécia, de navio,  demoraram meses para chegar, e muitos outros detalhes para se concretizarem precisaram um longo período. Ou seja, por um longo tempo essa pessoa era preenchida com algum detalhe que faltava ou mesmo que já tinha chegado. O prazer daquela festa era contínuo e atingiu seu auge com sua realização, mas não necessariamente acabou naquele momento, ainda por vários meses oferecia algo para a pessoa. É como o processo de uma lareira. Demora a atingir o máximo de sua temperatura, leva um tempo para aquecer todo o ambiente, e quando não mais a alimentamos com lenha, seu calor ainda fica erradiando por um bom tempo. O prazer imediato é simplesmente colocar fogo no álcool gel. Pega logo, evapora logo, e o ambiente não se aqueceu. Freud trocava correspondências sobre suas teoria com vários colegas que habitavam outros países. Imaginem o tempo que isso não demorava, e não é por isso que sua obra é pobre. Muitos podem não concordar, mas não se pode dizer que não tem conteúdo. A postura que defendendo é totalmente contrária ao que a sociedade ocidental hoje valoriza. Prefiro ter menos bens materiais mas ter mais de mim mesma. Prefiro me sentir como aquele nobre que demorou meses para realizar a festa. Não preciso de coisas imediatas, de mostrar o que tenho, preciso é do dia a dia, de como ele se apresenta e de como me sinto.

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