domingo, 5 de junho de 2011

Curtas: Woody Allen

Recentemente li uma notícia sobre o próximo filme do Woody Allen, "Meia noite em Paris". O que me chamou bastante atenção foi a declaração do cineasta que transcreverei na íntegra, porque espelha muito de sua personalidade e mostra, no caso dele, o processo criativo que normalmente os geniais tentam colocar sob uma "aura" de obscuridade. Woody Allen disse: "Eu não sabia o que ia escrever. Sabia que ia fazer um filme em Paris. Pensei em um título que adorei - 'Meia-noite em Paris', que sugeria muito romance -, mas não sabia o que iria acontecer à meia-noite em Paris. Passaram meses e eu não pensava em nada [da história]. E então me ocorreu que, um dia, alguém estaria andando nas ruas, um carro aparece, alguém de dentro grita 'entre' e o leva para um lugar diferente. Tive sorte que desta vez pensei em algo. Mas poderia não ter pensando em nada - e ter de mudar o título para outra coisa." Woody Allen é assim, em seus filmes ele retrata o cotidiano, o simples, que não são tão simples e que fazem parte. No cotidiano não há  relações sem conflitos e confusões, existem zilhões de perguntas sem respostas, e muitas dúvidas sobre o desenrolar dos acontecimentos e de nossas escolhas. Sua declaração mostra isso, escolheu um título e nem sabia como seria o conteúdo. O início de um processo criativo não nessariamente é algo com raízes obscuras, em que o autor mergulhou em pesquisas ou em si mesmo e a partir de então a "grande obra" surgiu. Para Woody Allen o processo criativo também é algo corriqueiro e espontâneo. Gostou de um título....... um dia algo surgiu que cabia, que bom. Simples. Seus filmes são assim. Falam das pessoas, suas dúvidas, suas dificuldades, de maneira tragicômica (a vida é assim) e bem realista (no sentido de espelhar o processo que ocorre na realidade). Seus filmes espelham uma realidade das relações mais desnudada, rotineira, e não é por isso que são monótonos. Pelo contrário, trazem alívio, nos vemos como "normais", porque consciente ou inconscientemente nos identificamos com seus personagens confusos. Ele tem essa capacidade, seus personagens são sempre cheios de conflitos, têm dificuldades de tomar decisões, aprisionados em situações que não querem mais e não que conseguem se desvenciliar. Woody Allen tem a genialidade cotidiana. Nos deixa confortáveis em nos sentirmos como seus persongens, deixa de lado o conceito moral de certo e errado e mostra a aparente simplicidade e complexidade dos conflitos humanos. Dia desses vi já começado um filme seu no qual o personagem principal era um escritor que buscava seu espaço e que tinha muita dificuldade em colocar para o outro o seu desejo, sempre abria mão de si mesmo. Uma das situações era com seu analista, que já há dois anos frequentava e nunca tinha ouvido uma palavra dele enquanto deitado no divã divagava sobre sua vida. Já no fim do filme, esse escritor conseguiu finalmente tomar decisões por si próprio e mudar várias coisas em sua vida e pergunta ao analista: "o que você acha disso"?. O analita devolve a pergunta: "o que você acha disso?". Identifiquei-me na hora, tanto como analista como analisanda, acontece comigo frequentemente tanto de um lado como de outro. A cena foi tão isenta de enfeites, de brocados, é assim que acontece mesmo, é a vida como ela é. Woody Allen tem essa habilidade especial. Nos mostra o cotidiano, os nossos conflitos de maneira tão natural que por fim nos sentimos tão bem ao assistir seus filmes. Nos sentimos nós e isso faz muito bem.

4 comentários:

  1. Patricia,

    Gosto d teu blog, exatamente pelo tema: cotidiano.
    A gente tem a besta mania de achar que só deve refletir sobre as *grandes* coisas, sem perceber que é no cotidiano que se encontram as coisas que realmente merecem ser pensadas/refletidas/analisadas.

    Parabéns pela iniciativa!

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  2. Olá Patricia,

    Também acho que o cotidiano é que nos "ensina" sobre as "grandes" coisas, e por isso devemos prestar mais atenção a ele. Espero que continue gostando.

    Abraços,
    Patrícia

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  3. Adora Woody Allen e adoro o blog!

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  4. Muito obrigada. Fico bem feliz em saber.

    Abracos,
    Patricia

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