segunda-feira, 30 de maio de 2011

Curtas: Arrumações


As arrumações, não diárias, têm sempre algum significado além o da organização. Sabe aquele dia que a gente acorda e resolve fazer "aquela" limpa no guarda-roupa e depois de tudo acabado parece que a alma também foi arrumada. Essa "arrumação" subjetiva tem sensação de novidade, de mudança, de um  abrir espaço para coisas novas. Normalmente, nessas arrumações, pode acontecer de encontrarmos coisas que durante muito tempo foram tão queridas, tão usadas, mas que de uns tempos para cá perderam aquele significado especial (quando novos hábitos substituem os velhos). Não podemos esquecer também daquelas que foram adquiridas por algum motivo, que acreditávamos muito querer, mas que praticamente nunca foram usadas. Para cada um há vários significados que podem vir junto a esse "corriqueiro movimento" de arrumar. Lembro que recentemente uma das minhas filhas (7 anos), pela milhionésima vez, queixava-se de uma amizade, do quanto não se sentia reconhecida, que sentia-se magoada com algumas atitudes, etc, etc, etc, e eu dirigindo na Rodovia Dutra. Em um determinado momento me cansei de tanta ladainha e resolvi dar um basta usando uma metáfora. Meu objetivo era que ela não entendesse bem sobre o que eu estava falando e mudasse de assunto. Falei enfaticamente, olhando a estrada e o retrovisor: "troca de sapato, esse não te serve mais, seu pé já está diferente, esse brilho um dia foi bonito, mas agora não é mais. Troca de sapato porque este não se serve mais". Silêncio. Pensei: "funcionou". Daqui a pouco ouço: "Você está falando sobre as amigas, não é?" Não acreditei na hora o quanto ela compreendeu e agora quando falo em sapatos elas já dizem: "chega dessa história de trocar de sapatos", uma porque não gosta de mudanças e a outra porque tem dificuldade de abandonar algo que antes brilhava e que agora não brilha mais. Todos temos nosso motivos para as arrumações. É bom fazer isso de vez em quando, dá uma sensação de leveza e revigora nossa energia. Como está seu armário? Precisando de arrumação? A minha arrumação fiz recentemente, por etapas, não dava para fazer tudo de uma vez. Agora está tudo parecendo tão no lugar e quero que fique assim, assentada, por um tempo. Muitas vezes se tem muita coisa acumulada, dá muito trabalho, só que o resultado pode surpreender.

quarta-feira, 25 de maio de 2011

Quando novos hábitos substituem os velhos


Lembro-me muito bem que anos atrás, em um processo seletivo, a selecionadora me pediu para que fizesse uma redação sobre mim (tema manjadíssimo em processos seletivos), só que no computador. Não esqueço a abordagem que fiz. Elaborei uma redação na qual defendia o quão não natural eu achava escrever sobre mim no computador. Tal ferramenta me permitia que eu corrigisse com frequência o que tinha escrito, e no papel, mesmo se houvesse rascunho, dificilmente poderia modificar muito do original. Coloquei também que sentia certa artificialidade nas palavras, porque quando usava a caneta, o lápis e o papel eu sentia que as palavras no papel eram extensão de mim. Vinham da minha mente, da minha alma e se materializavam através da escrita. Um processo totalmente meu, sem um intermediário, nesse caso o teclado (a selecionadora não me achou delirante, talvez esquisita). Mas não é isso que interessa, mas sim, refletir sobre esse processo de substituição dos velhos hábitos por novos, e como esse processo demanda tempo. 
Evolucionistas colocam que o ser humano no geral é resistente a mudanças porque, nos primórdios, algo novo poderia significar a extinção daquele bando. Era necessário antecipar os acontecimentos. Claro que isso faz parte, porém gostaria de "olhar" sob outro prisma. Quando uma empresa resolve mudar toda uma postura de recursos humanos, comercial ou de sua cultura dominante, não dá para querer que no dia seguinte todos os colaboradores e fornecedores vejam sentido nessa nova maneira de ser. Os gestores dessa empresa, com certeza, não planejaram e implantaram tais mudanças em dias, provavelmente por anos foram tomando forma. Os gestores tiveram oportunidade e tempo de expiar seus velhos hábitos, entendê-los e dar sentido aos novos. Só que isso acontecia a portas fechadas, era exclusivo, para poucos. Que direito, então, esses gestores têm de exigir que em um curto espaço de tempo os colaboradores e fornecedores tenham que aceitar sem resistências essas mudanças? Nenhum. Mas, infelizmente, no mundo corporativo não é assim que funciona. Os tais "resistentes" são substituídos. Lógico que existem resistentes patológicos, mas não é sobre eles a quem estou me referindo. Eu sempre tive meu textos, minhas idéias, minhas dúvidas em cadernos, desde minha juventude.
Tenho-os guardados comigo até hoje e trazem muito da minha história. Mas, de uns tempos para cá, aos poucos, essa artificialidade que eu acreditava existir, em escrever meus pensamentos com a tecnologia, começou a não me incomodar mais. Prova disso é o cotidiano reflexivo. A escrita sempre fez parte do meu subjetivo, sempre organizei meus pensamentos em cadernos, folhas e nunca no computador. Sentia que minha espontaneidade, minha naturalidade seria aniquilada se fosse diferente. Inclusive na faculdade alguns dos trabalhos que precisavam ser feitos eu antes fazia no papel para depois transcrever no computador. Em paralelo o mundo corporativo exigia que eu lidasse com a tecnologia também no meu processo criativo. Comecei a expor-me profissionalmente através da tecnologia, mas continuei mantendo o processo criativo pessoal com a escrita manual. Só que aos poucos fui me dando conta que o processo criativo próprio não iria perder seu sentido se eu usasse o teclado. Continuaria sendo uma extensão do meu eu. Finalmente o uso da tecnologia fez sentido, mas esse processo demorou um tempo.
Que venham as mudanças. Substituir velhos hábitos é muito bem vindo, sempre crescemos e aprendemos coisas novas, mas é necessário ter um tempo, um tempo próprio. Sempre que precisamos jogar fora algo nosso ou aposentá-lo, o que virá para substituir, precisa ter sentido. Muitas vezes o difícil é isso. . . .  . dar sentido ao novo.

terça-feira, 24 de maio de 2011

Ainda somos um Brasil colônia


Hoje li no jornal que o prefeito do Rio de Janeiro arrependeu-se de sansionar uma lei municipal na qual qualquer obra, para as Olimpíadas de 2016, deverá ter sua aprovação submetida à câmara dos vereadores (veja matéria na íntegra). Essa lei contraria uma que é federal. O prefeito, quando percebeu o contrassenso, tentou voltar atrás, mas a câmara não deixou. Lógico que a câmara vai querer aprovar as obras por alguma troca financeira. O prefeito declarou que não leu o texto minuciosamente.  Não sei o que é o pior: um prefeito que assina uma lei sem ler direito ou se a proposta de tal lei. Tudo nessa história é péssimo e todos os dias nos deparamos com escândalos de corrupções, porém, em parte, talvez sejamos responsáveis pela manutenção desse ciclo. Não nos mobilizamos enquanto nação, enquanto povo e me incluo nessa posição. Ficamos indignados, comentamos entre os colegas, mas depois de um tempo deixamos para lá, . . . . . . . .é assim mesmo, sempre foi. O desrespeito ao ser humano pelo poder público é tanto que até comida estragada na merenda escolar é encontrada. Isso é gravíssimo e por que será que não nos mobilizamos? Acredito que um sociólogo ou um psicólogo social poderia explicar com mais conhecimento mas farei uma breve reflexão: fomos colonizados por países que se interessaram em sugar, destruir e usurpar qualquer algo de valor que tínhamos. As riquezas minerais eram extraídas e enviadas para fora. A mão de obra local eram escravos. Os não escravos, vampiros sociais e financeiros. A família real veio para cá fugida, não tinha nenhum interesse em desenvolver o país. O monarca que declarou nossa independência era um fanfarrão, mulherengo, que por algum motivo ligado a prazeres individuais fez tal declaração.
Quando fomos um povo que lutou junto para um bem coletivo? Qual é nossa identidade como nação? Até hoje deixamos que outros países do mundo venham aqui, tirem nossas riquezas, nossas identidades e continuamos imóveis.
A música do Chico Buarque, Geni e o Zepelim, fala claramente sobre a posição que o Brasil se coloca em relação aos outros. Daqui retiram tudo. Por mais resistente que eu seja em valorizar a cultura americana não posso deixar de admitir que eles tem uma identidade muito bem estabelecida. A Inglaterra idem. A monarquia está lá mantendo algo ligado às raízes daquele país, nós concordando ou não. E tantas outras noções também.
Nós sequer valorizamos a cultura de outros estados brasileiros. Os paulistas (sou um deles) enchem o peito para dizer que são a potência financeira do país . . . . só que funcionam como o modelo econômico americano. Produção, produção, dinheiro e dinheiro. Os mineiros já tem seu jeito próprio de ser, são valorizados, por quem? E os baianos? O que dizemos deles? Aí vem algum político dizer que o Brasil tem uma enorme riqueza cultural. . . . . .  que nosso valor está nisso, que no mundo não tem país semelhante . . . . . e? Somos unidos como nação? Eu tiro o chapéu para o Rio Grande do Sul. Sofrem críticas o tempo todo que são bairristas, mas se formos analisar friamente eles mantém muitas tradições vivas até hoje, é um povo unido. Na Argentina recentemente (vários anos) o povo foi às ruas em um panelaço..... diferentes pessoas se manifestaram. Aqui entregamos aos jovens a tarefa de sair às ruas para mostrar uma postura opositora. Lembram-se do impeachment do Collor, foram os estudantes cara pintada. É óbvio aquele fim já estava programado, o Collor fez algo que mexeu com muita gente. Não foi o movimento dos cara pintada, mais uma vez. . . . . massa de manobra. Acho que o único movimento popular autêntico, no Brasil, que eu presenciei foram As Diretas Já.... esse sim partiu de um povo já cansado de ficar calado de ser oprimido (Cálice - Chico Buarque). Depois disso, não lembro de outros movimentos sociais que nos tiraram de nosso modus operandi colônia vampirizada. Incluo-me nessa, nem sei por onde começar.

sábado, 21 de maio de 2011

Quando se tem muito a perder porque não se tem nada


Não são somente as crianças que são invadidas por produtos e engenhocas que garantem prazer instantâneo (veja texto o consumudo x nâo para os filhos). Os adultos também sofrem do mesmo mal e diferente das crianças, muitas vezes ficam aprisionados nesse ciclo de consumo, status e prazer imediato. Preenchem o vazio com coisas.
Tenho uma amiga cujo principal objetivo profissional era conquistar uma gerência na empresa que estava ou em outra. Para ela a satisfação de tal conquista era o principal juntamente com a recompensa financeira que viria. Acreditava que ter um carro melhor, poder viajar muito, morar em um lugar maior lhe traria felicidade absoluta. Hoje ela está questionando tudo isso, está com um cargo de gerência em uma multinacional, trabalha sob muita pressão e percebeu que é a marionete dos diretores, assim como todos os gerentes. Via de regra os profissionais de alto escalão - gerentes, diretores, superintendentes e presidentes têm muito a perder. Seus salários são elevados, os benefícios também e seu padrão de vida tem alto custo. Possuem apartamentos enormes cuja manutenção é alta, carros que andam e falam por conta própria, viagens ao exterior, jantares em lugares caros e da moda, roupas de grife, etc. Tudo isso tem um preço, financeiro e emocional e que em determinado momento perde sentido. Quando percebem que seus cargos estão ameaçados simplesmente passam a bola. Que perca o emprego outro e não eu. Não necessariamente essa pessoa é má, sem valores de coletividade, mas ao longo de tantos anos de vida sustentou seu valor como pessoa, no ter, por isso, para continuar a ser essa pessoa que acredita valorizar e que os outros valorizam precisa manter o status quo. 
Sofrem diariamente com conflitos morais.  Normalmente as pessoas de cargo elevado acumularam bens para satisfazer um desejo imediato, o prazer vem e vai  em pouco tempo. Portanto, na sequência,  precisam preencher o vazio com outra coisa que vem de fora. Defendem seus cargos como feras selvagens, doa a quem doer. Não é bem um estilo agressivo de administração, mas um estilo agressivo de defender aquilo que tem medo de perder.  Certa vez vi um documentário sobre uma tradicional casa de chás do Rio de Janeiro em um nobre (acho que foi no século 17) planejou uma festa e a realizou dentro do período de quase dois anos. Lembro que os cristais vieram da Suécia, de navio,  demoraram meses para chegar, e muitos outros detalhes para se concretizarem precisaram um longo período. Ou seja, por um longo tempo essa pessoa era preenchida com algum detalhe que faltava ou mesmo que já tinha chegado. O prazer daquela festa era contínuo e atingiu seu auge com sua realização, mas não necessariamente acabou naquele momento, ainda por vários meses oferecia algo para a pessoa. É como o processo de uma lareira. Demora a atingir o máximo de sua temperatura, leva um tempo para aquecer todo o ambiente, e quando não mais a alimentamos com lenha, seu calor ainda fica erradiando por um bom tempo. O prazer imediato é simplesmente colocar fogo no álcool gel. Pega logo, evapora logo, e o ambiente não se aqueceu. Freud trocava correspondências sobre suas teoria com vários colegas que habitavam outros países. Imaginem o tempo que isso não demorava, e não é por isso que sua obra é pobre. Muitos podem não concordar, mas não se pode dizer que não tem conteúdo. A postura que defendendo é totalmente contrária ao que a sociedade ocidental hoje valoriza. Prefiro ter menos bens materiais mas ter mais de mim mesma. Prefiro me sentir como aquele nobre que demorou meses para realizar a festa. Não preciso de coisas imediatas, de mostrar o que tenho, preciso é do dia a dia, de como ele se apresenta e de como me sinto.

sexta-feira, 20 de maio de 2011

Curtas: Por que os esquimós se fixaram no pólo norte?


Nesses dias com temperaturas mais baixas, ainda no outono, já está difícil sair do banho, esquentar o pé, a ponta do nariz. Quando chegar o inverno mesmo, aí sim é um sufoco. Nessas horas eu fico refletindo. O frio é muito ruim, castiga bastante o corpo humano, pode nos matar e mesmo assim os esquimós habitam o pólo norte. Por que? Nós somos o único animal que consegue instalar-se em ambientes agressivos à espécie graças a manufatura de instrumentos e vestimentas. Mas mesmo assim, porque eles ficaram por lá, nem plantar tem como, só tem frio. Já li que não se sabe com certeza o motivo, mas acredita-se que foram expulsos pelos índios americanos. Seja lá o motivo que for, mesmo assim, ficaram em uma região árida de vegetação e calor. Realmente são muito hábeis no "cultivo" da sobrevivência. As vestimentas são peles de urso ou foca, viradas para dentro para proteger mais. A linha são os tendões dos animais que caçam e desenvolveram técnicas para caça e pesca exclusiva para esse ambiente. Impressionante essa capacidade que a espécie humana desenvolveu de adaptar-se e sobreviver a praticamente a qualquer ambiente. E somos a única espécie que depende de ferramentas para nossa proteção. Essa é nossa defesa, a manufatura. Se um animal maior nos atacar, pode até ser um cachorro grande, não temos garras, mordidas, velocidade, força e outros mecanismos de defesa, somos presa fácil. Talvez, em algum momento de nossa evolução, a espécie humana tivesse ficado à mercê da extinção, mas isso deve ter sido há muito. . . . . . muito. . . . . . muito tempo atrás.

Diagnósticos precoces: rótulos infantis


Em uma das aulas de psicologia abordei o tema transtorno bipolar com um filme. Depois que o filme acabou os alunos fizeram várias perguntas, uma delas foi a respeito da idade em que os sintomas podem surgir.  É uma pergunta muito difícil de ser respondida porque em crianças e adolescentes os diagnósticos psicopatológicos têm que ser muito, mas muito minuciosos, pois a criança pode apresentar comportamentos e emoções que são parte daquela fase de desenvolvimento e não necessariamente sintomas de alguma patologia. É um assunto que me preocupa muito quando atendo pais que trouxeram diagnósticos psiquiátricos de seus filhos embasados somente por comportamentos, cuja história de vida social e familiar não foi investigada. Todos nós, sãos ou não, em diversos momentos de nossas vidas podemos apresentar comportamentos bizarros ou reações exacerbadas frente a situações no cotidiano. Isso não quer dizer que estamos com alguma patologia, nem que vamos desenvolver uma, pode estar relacionado ao momento de vida. Se com adultos desenvolvidos, com profissões estabelecidas, famílias constituídas já existe uma tendência a medicalização imaginem em crianças e adolescentes que estão em fase de desenvolvimento. Tudo pode ser normal para aquele momento, mas também pode ser a denúncia de que algo não vai bem. A profunda investigação é fundamental. Recentemente li uma matéria em uma revista de psicologia abordando essa questão “O desafio do diagnóstico precoce”: dois professores da Universidade La Sapienza de Roma defendem que há quadros estreitamente ligados ao processo de crescimento. Colocam que: “em linhas gerais, para chegar a um diagnóstico adequado, o clínico deve avaliar os pontos fortes e vulneráveis tanto da criança quanto de sua família, investigando a capacidade de adaptação e atuação”.
dinâmica familiar
Usam da seguinte frase: “cada caso é único”. Na mesma revista li outro artigo sobre o caso de um agricultor que queria ser lobisomem (reportagem na íntegra). Só de ler o título já se imagina que o homem está completamente surtado, mas com o decorrer do artigo me surpreendi com a humanização com o qual o caso é tratado. Esse agricultor trabalha de sol a sol, mantém relacionamentos familiares e amorosos estáveis. Tem uma vida comum, com emoções comuns, excetuando quando em algumas noites diz sentir-se transformado em lobisomem e sente atração de uivar para a lua. Além disso o artigo deixa claro que na família esse comportamento não é repudiado, pois o pai não se importa e a mãe valoriza, acha que o filho tem um dom, ela é bastante mística.  Existe, na psiquiatria, um nome para o delírio em que o paciente se identifica com os animais: licantrópico. Mas pelo visto, M. de 38 anos, tem tal delírio, mas isso não quer dizer que não possa conviver em sociedade sem medicações e rótulos. Com as crianças é igual. Antes do rótulo escolar, da família criticar pais e mães pelos comportamentos das crianças e levá-los a especialistas para torná-los “normais” é preciso investigar, perguntar, escutar a criança. Existem sim, quadros de psicopatologias infantis que devem ser cuidados, é muito sério, mas muito cuidado é pouco. Segue o link de um vídeo que retrata a confusão de hoje com  rótulos psiquiátricos. Vejam, usem mais uns minutos para refletir sobre o reflexo dos diagnósticos precoces.

quarta-feira, 18 de maio de 2011

Quando não se quer, não se pode ou não se consegue enxergar


Por esses dias comecei a ler uma reportagem em uma revista feminina sobre histórias de pessoas que internaram involuntariamente o filho por causa de drogas. A primeira história relatada era um contrassenso em termos de saúde mental. Uma mãe descobriu que o filho, de 18 anos, usava drogas havia anos e já tinha desenvolvido dependência. Primeiro internou-o por 15 dias para uma desintoxicação e não surtiu resultado. Então, a mãe resolveu interná-lo em uma clínica com um programa mais extenso, mas queria um lugar que aceitasse ela interna junto para que continuasse cuidando dele, para que ficasse ao lado dele o tempo todo. Diz ter procurado exaustivamente uma clínica que aceitasse a proposta, até que uma caríssima (palavras do depoimento) aceitou. Bizarro, que dinâmica familiar é essa? Provavelmente algumas clínicas não aceitaram porque têm práticas duvidosas e não queriam que fossem expostas. Mas no meu imaginário, algumas são sérias e se preocupam com a saúde mental. Devem ter dito claramente para essa mãe que isso era totalmente disfuncional, simbiótico, e que ao contrário de ajudar atrapalharia o tratamento do filho. A grosso modo, no tratamento de dependência química, um dos quesitos importantes é tirar o paciente da infantilização, da busca da satisfação dos prazeres de maneira imediata. É necessário que a angústia tenha espaço de permanência no indivíduo e que ele aprenda a fazer alguma coisa com isso, não anestesiá-la. O filho estava doente, precisando apropriar-se de seus sentimentos, emoções e limitações. Só que ela, se internando junto, tira do filho essas possibilidades, encapsula-o através da justificativa de ser uma mãe totalmente boa. Ficou 6 meses internada com o filho e disse sair da clínica só de final de semana. A reportagem relata que mãe e filho dormiam no mesmo quarto e no dia que chegaram os dois precisaram tomar calmantes, ela por seus motivos, e ele pelos dele. Quanto mais eu lia mais chocada eu ficava. A clínica aceitou esse quadro doentio por dinheiro, não estava nem um pouco interessada na saúde mental, mas na engorda da conta bancária. Fico imaginando que essa mãe deve ter ouvido de diversos profissionais e clínicas que não havia nada de saudável em tal plano. Mas ela não pôde, não conseguiu ou não quis enxergar sua própria disfuncionalidade e o quanto isso poderia ser danoso ao filho. Esse é um exemplo que escancara um mecanismo de defesa do ser humano, faz parte de sua sobrevivência emocional. Só que usá-lo com tal extremismo causa o efeito contrário, nossa morte psíquica e de quem está em volta.  Não enxergar tal comprometimento é assustador. Inclusive a mãe coloca na reportagem que, depois de duas semanas dessa “internação simbiótica” (eu que denominei), ela percebeu que ele não estava pronto e internou-o novamente. Será que ela se perguntou porque?
Certa vez dei uma devolutiva a uma mãe mostrando o que eu  estava enxergando no cenário da dinâmica familiar e o quanto essa dinâmica refletia na filha. Na sessão seguinte, quando trouxe a filha, me disse ter refletido muito durante a semana e completou: “minha mãe me disse que finalmente alguém teve coragem de dizer o que todo mundo estava vendo e só eu não”. Disse-me ter ficado chocada ao ouvir isso e que não sabia que as coisas estavam tão ruins assim. Foi um movimento foi bom, positivo ela conseguiu enxergar à sua volta. Em vários momentos da vida, por motivos que só cabe a nós, não podemos, não conseguimos ou não queremos ver. Só que quando abrimos a cortina e deixamos a luz mostrar o que está ali, temos  possibilidade de fazer escolhas, sejam elas quais forem. A disfuncionalidade está em manter-se na escuridão o tempo todo.  Usar de certa neblina visual, densa ou não de vez em quando, faz parte, retirar totalmente a luz . . . . . . . . .  um perigo.

segunda-feira, 16 de maio de 2011

Curtas: histórias para boi dormir



As propagandas de hoje estão exagerando na tentativa de tornar humanizada uma relação que é comercial. Está ficando ridículo. Tem uma propaganda de uma seguradora de carros que conta uma historinha de dois irmãos pequenos em um carro. O menorzinho puxou o freio de mão e o carro andou para trás. Quem os salvou foi o irmão maior que pulou dentro do carro, pelo vidro da frente. Uau! Tem também aquela que uma noiva e uma senhora entram correndo em um supermercado dizendo que o bouquet sumiu. Uma “consultora” do supermercado diz para elas ficarem calmas, irem para a igreja que ela já levaria um bouquet. A consultora o fez flores que o estabelecimento vende e um “lindo” laço. Nesse comercial aparece em letras  que a história foi inspirada em uma experiência da consultora Beth. Fico me perguntando: inspirada como, que parte? Será que a Beth estava dormindo quando sonhou algo assim? Que noiva é essa perde o bouquet a caminho da igreja, dentro de um carro? Que noiva é essa que para em um supermercado e não em uma floricultura para providenciar um bouquet urgente? Que historinha mais linda, casar com um bouquet de supermercado. Como essa rede é maravilhosa, em um momento crucial, de extremo aperto da noiva, um supermercado a salvou. . . . . . e seu sonho . . . . . . se realizou completamente. E a tal seguradora que divulga uma historinha de um rapaz lerdinho que nem conseguiu puxar o freio de mão, cujo irmão maior é um super herói. Se o pequeno conseguiu soltar o freio, deveria ter uns 6 ou 7 anos, portanto o outro ocupante do carro, pelo menos 8, será que já não dava para puxar o freio? A mensagem final é: nunca deixe crianças sozinhas dentro do carro. Leia nas entrelinhas: pais irresponsáveis, deveriam levar um puxão de orelha. Infantilização. Moral da história: as empresas e indústrias acham que nós, os consumidores, somos uns bobos, e nos querem comprar com historinhas para boi dormir. Preferia as da minha avó, muito melhores.

sexta-feira, 13 de maio de 2011

Coletividade no cotidiano



É um tema que não se esgota em algumas reflexões. Acredito que devemos diariamente procurar encontrar onde está a coletividade em nosso cotidiano. Não esqueço até hoje a frase inicial de um texto de Freud: “o homem é um animal gregário”.  Lembro-me também que na época não sabia o significado da palavra gregário, depois de descoberto . . . . fez tanto sentido.  Deveríamos continuar em bandos, mas a cultura global está impondo, e nós aceitando, a negação de nossa natureza.
A cultura global impõe que temos que ser diferentes, que não precisamos dos outros e ao mesmo tempo não podemos ser autênticos, temos que ser massificados. Esse revés ao natural causa vazio existencial. Não é à toa que os quadros depressivos estão cada vez mais freqüentes. Não é só a pressão do trabalho, as multitarefas, a violência em que vivemos. Cada vez mais nos afastamos de nossa origem. Originalmente somos coletivos e sempre será assim, é parte de nossa natureza. Porém na atualidade o que é valorizado, e almejado, é ser aquele que é apontado como autossuficiente. Só que na vida isso não acontece. Meu cunhado estava há vários meses procurando recolocar-se no mercado de trabalho (maneira bonita de dizer que ele estava desempregado e precisando de ajuda. Não se deve admitir necessidades nos dias de hoje, por isso se fala tão bonito assim) e finalmente após tanto sufoco e sacrifício ele conseguiu algo. Só que como é o começo é necessário primeiro estabilizar para daí mexer na rotina dos filhos. Por isso pediram ajuda para buscar a filha na escola pelo menos duas vezes por semana. Não só estou disponível como também é necessário esse suporte, assumi a tarefa e disse ser um benefício coletivo. Por que disse isso? Se eu não fosse nosso pai assumiria. Só que ele é um maduro, super ansioso, muito preocupado que fica nervoso se a escola chamou, se minha sobrinha (tem 11 anos) está demorando, etc. Quando a leva sempre a acompanha até o apartamento (não deixa na portaria como eu), quer ver se ficou bem. Essa frequência de nervoso semanal não faria bem a ele. Ele também me ajuda muito com minhas filhas por isso acho que é natural eu cuidar dele, dividir as “cargas”. Tem também a situação do meu cunhado, já a vivenciei algumas vezes, e sei o quanto é desgastante. Gera empatia:  pode acontecer comigo de novo, e provavelmente vou precisar de ajuda. Então: vu ajudar para ser ajudada? Ajudei porque vivo na filosofia judaico-cristã e sou boazinha? Não. É muito mais profundo e natural do que isso. Eles são meu bando e o bando cuida de si. Cuidar do coletivo, é natural, faz parte, é necessário. Por isso “benefício coletivo”. Hoje o coletivo no qual estou inserida é a família, mas também poderia ser um outro grupo. O que caracteriza o bando não é o parentesco mas sim o exercício original (de origem) da coletividade. Os cuidados que temos um com o outro não deveriam ser porque somos judaico-cristãos bonzinhos ou porque serei beneficiada por algum motivo, mas porque física e emocionalmente é importante ser um ser coletivo.

quinta-feira, 12 de maio de 2011

Curtas: Eu não sabia que estava grávida



É um programa do Discovery Home & Health que mostra casos “reais” de mulheres que só descobriram que estavam grávidas no momento em que pariam. Uau! Como pode? Todas as semanas apresentam dois casos. Assisto, dou muita risada e fico me perguntando como as pessoas se submetem a esse tipo exposição, será que tudo é inventado, procuro as idiossincrasias. Não só a mulher não sabe que está grávida, como também a produção transforma o fato em algo fantástico, sem nenhuma insanidade, corriqueiro. Antes o programa apresentava somente casos com obesas, só que agora são as magrinhas que estão parindo sem saber o que está acontecendo. Por que será que mudou o perfil dos casos? Realmente incrível. Um bebê, mesmo se pequeno - uns 2,5 kg, por volta de  47 cm, não proporcionar alteração alguma no corpo da mulher, um milagre da natureza. No programa fazem questão de frisar que fulana ou cicrana percebeu que tinha engordado um pouco, mas nada extraordinário e que o bebê nasceu a termo. Outro recurso apelativo é: em pelo menos um dos dois episódios da semana a gestante, que não sabia que estava grávida, tem o bebê na privada, isso mesmo, ele é parido dentro do vaso sanitário. Isso acontece porque a mulher sente muita dor, acha que é cólica intestinal e faz força. Teve um caso super bizarro: o casal tinha dificuldades para ter filhos e por isso a mulher não ficou nem aí para alguns sintomas estranhos. O marido foi viajar a trabalho, e ela em casa, sozinha, entrou em trabalho de parto. Teve o bebê no chão do banheiro, o enrolou em uma toalha e passou um dia e meio em casa só com o filho. Ela queria dar a notícia com exclusividade ao marido, por isso não telefonou, não avisou ninguém. O marido quando chegou em casa pensou que ela tinha roubado o bebê de alguém. História totalmente bizarra, e a mulher, se de fato essa história é toda verdade, estava em surto total. Será que quem vê acredita? Por que será que eu assisto? Às vezes acho que tenho a esperança que alguma história seja verdade. É muita cara de pau inventar tudo isso. Talvez uma pequena parte da história tenha reflexo na realidade, o resto fantasia. Contos de fadas para adultos. . . . . tudo acaba maravilhosamente bem.

terça-feira, 10 de maio de 2011

A indústria do consumo x não para os filhos


É uma dura batalha. Teve um dia que eu disse para minhas filhas que: ou a mãe delas (que sou eu) era muito chata ou elas pediam coisas demais. Já devia ter sido o centésimo não do dia.
A indústria do consumo joga bem pesado. Além da quantidade de propagandas de brinquedos nos canais infantis ou mesmo na TV aberta eles se superam nas inovações. Apelam para a massificação e produzem brinquedos diversificados, com bastante apelo visual (super bonitos, muito brilho), cheio de botõezinhos e novidades que encantam. Eu mesma quando vou a uma loja de brinquedos fico fascinada com a diversidade, com a criatividade dos fabricantes. Tem de tudo para todos os gostos e tamanhos. Ser criança hoje, tem esse lado que é rico em estimulações, mas por outro não é fácil, tem opção demais. Será que conseguem absorver toda essa informação e o que vem junto com ela, principalmente as menorzinhas. Vamos imaginar uma criança com 3 anos de idade. Está assistindo desenhos e no intervalo vê a propaganda de um boneco que fala e que quando colocado no piniquinho faz xixi igual a ela. Chega na escola, no dia do brinquedo, e os colegas trouxeram várias coisas diferentes do que ela tem. O que será que passa na cabecinha dessa criança? Será que ela entende esse monte de opções e que só dá para ter algumas? Existem tantas opções que esse algumas parece tão pouco. Acho que a criança se frustra muito, sem necessidade, já que na maioria dos casos aquele brinquedo tão desejado é esquecido em 2 dias, é um prazer momentâneo que logo se esvazia. Cheguei a uma conclusão depois de tantos nãos e depois que minhas filhas cresceram um pouquinho. Os brinquedos são legais, mas nada substitui o contato humano, o afeto a troca. Pode ser a maior engenhoca do mundo, a criança percebe o vazio. Em um churrasco que fomos outro dia, nossas filhas eram as únicas crianças da turma, como elas iriam se entreter? Logo acima havia um parquinho de areia com balanço, gira-gira e outras crianças. Resultado: ficaram lá um tempão brincando com essas outras crianças, e eu e meu marido ficamos no quiosque conversando com os amigos (comendo e bebendo também), e quando fomos embora estávamos todos felizes. Encontramo-nos com pessoas agradáveis, trocamos afeto, reforçamos vínculos. As meninas trocaram experiências, exercitaram a criatividade e fizeram novas amizades. Ficaram muito bem. Não existe prazer momentâneo vindo de uma engenhoca toda linda e complexa que substitua ao prazer da troca e contato com o outro. Já me questionei sobre dar ou não diversas novidades do mercado e quanto mais o tempo passa mais vejo o quanto esses brinquedos não fizeram falta alguma no desenvolvimento afetivo e social delas.
Portanto, indústria do consumo, pode vir com suas novidades e engenhocas efêmeras. Encantam, mas também sei que tem algo mais importante que se cultiva todos os dias, os laços afetivos.

Curtas: fila do supermercado

Vou começar a fazer uma sessão de curtas. Assuntos que provocam leves reflexões e que não cabe, ou talvez eu não consiga, um desenvolvimento extenso.


No passado, sempre que ia ao supermercado acompanhada de crianças a hora de ir para a fila do caixa era um sofrimento. Nos caixas, os supermercados colocam gôndolas expondo um monte de produtos de última necessidade: tem balas, chicletes, salgadinhos, e uns brinquedinhos (um tubo cheio de balas de açúcar) que são ventiladores, martelos, superheróis, etc.... As crianças sempre se debruçam nesses produtos e ficam experimentando os brinquedinhos e pedindo tudo que está lá. No começo eu falava que não podia mexer, rezava para a fila andar logo, tentava distrair mostrando outra coisa, mas um dia conclui: o supermercado está aí deixando exposto para a criançada ver e pedir para comprar, certo? Então eles devem estar assumindo o risco de alguma criança estragar alguma coisa, certo? O supermercado quer empurrar e eu não quero comprar. Então, porque minhas filhas têm que pagar o preço de ficar ouvindo: “deixa aí, não mexe, não vou comprar, é só bala com açúcar faz mal, fica perto, não vá à outra gôndola, etc. Parei com isso. O supermercado é que se lixe. Enquanto estou na fila elas se divertem apertando os botõezinhos e depois vamos embora sem os brinquedinhos, sem os petisquinhos e principalmente, sem stress.  

sábado, 7 de maio de 2011

Ministério da saúde adverte: viver traz prejuízo à saúde



Cada dia mais os pesquisadores estão encontrando as possíveis causas que desencadeiam várias doenças no ser humano, e que podem ser fatais. Vamos comemorar? Em vários desses casos eu não vou. Recentemente surgiu um estudo que concluiu que café, sexo e assoar o nariz são gatilhos para derrames. Outro dia li a respeito da comprovação que o deprimido vê realmente o mundo mais acinzentado. Na televisão, com freqüência, tenho visto propagandas que aterrorizam mães através do temor de que germes e bactérias (aquelas que estão presentes no dia a dia e habitam a terra há milhares de anos) deixarão seus filhos doentes. Em uma delas a mãe se diz microbiologista, que lida com germes o dia todo, mas que não está sempre presente o tempo todo para proteger seus filhos desses organismos e por isso usa o sabonete X. A outra mãe recebe uma ligação urgente da escola, pois o filho estava com dor de barriga. O pediatra diagnostica infecção intestinal que ele pegou através das mãos. Quem salva essa mãe de tal “negligência”? O sabonete Y. Tem também um produto que tira manchas de roupas e que mostra os germes e bactérias se proliferando no cesto de roupa suja. Defendem a importância de usar o produto para se proteger. Sabem do que quero me proteger? De ser obtusa, de não saber rir, de não aproveitar as amizades, de não passear com minhas filhas. Quero me proteger dessa ilusão de que, se seguirmos determinadas cartilhas, teremos nossa sanidade e longevidade garantidas. Quero me proteger dos que me impedem de viver objetiva e subjetivamente. Vou continuar assoando o nariz, fazendo sexo, tomando banho com sabonete comum e me esquivando da contaminação dessa filosofia que prega catástrofes. Isso sim são germes e bactérias letais. Esses sim são campos muito férteis para a proliferação do medo de viver espontaneamente. Recentemente li na Superinteressante que os homens das cavernas cortavam o cordão umbilical a dentadas. Imaginem a higiene bucal do homem das cavernas, nem dá para imaginar. Esse “detalhe” não impediu a humanidade de continuar viva e continuar se reproduzindo. Pena que os da espécie dos “homideos catástrofes e os homideos economicus” também continuaram a se reproduzir . . . . . e sobreviveram.

Campeões de audiência


Quando imaginei a proposta quis fazer algo que estivesse relacionado a coisas e fatos do cotidiano que nos cercam e que podem desdobrar-se em vários outros pensamentos.
Sei que não é algo que atinja uma vasta população, mas acredito que existem alguns interessados e por isso fui ver a estatística de acessos aos textos. O que descobri foi muito interessante. O texto campeão de audiência (superlativo) é "Diga não ao soutien infantil" e o lanterninha "O poder da instituição psiquiátrica" com apenas três acessos. Um eu sei que é de uma amiga, outro do meu marido e o terceiro desconhecido.
Certamente foi combustível para reflexão tanto a posição de um quanto a de outro. No meu imaginário o texto "Mãe e culpa: eterna equação"  tomaria a primeira posição rapidinho, é algo que todas sentem ou sentiram em diversos momentos de sua maternagem. Esse texto está na média, fiquei intrigada. O lanterninha não me surpreendeu. O tema saúde mental é muito difícil de ser compreendido socialmente e por isso existe incômodo a qualquer coisa que se refira a ele. Para ilustrar o comentário: dou aula em um curso técnico de segurança no trabalho e estava dando um tópico sobre doenças mentais incapacitantes. Um aluno me perguntou um exemplo de uma doença cujas funções mentais estavam preservadas, mas que impedia o trabalhador de atuar em sua função. Dei um exemplo de transtorno obsessivo compulsivo. Coloquei que se houvesse um colega de sala com esse transtorno cujo ritual para conseguir entrar na sala de aula fosse ter que abrir e fechar a porta dez vezes, esse ritual seria muito “estranho” ao restante do grupo. E não só falei como também fiz a cena. Enquanto eu estava contando o abrir e fechar a porta eles começaram a rir. Aí parei e disse que a contagem tinha sido atrapalhada e que o portador do transtorno teria que começar de novo, e o fiz. Risada geral e um aluno falou: “bate a cabeça na parede que para”. Mostrei a eles que essa seria de fato a reação do grupo caso essa situação existisse de fato.  Não estava julgando a atitude deles, mas ilustrando como a doença mental aos olhos do grupo é esquisita e a aceitação e compreensão social desses transtornos é difícil. Mostrei que esse transtorno incapacita a pessoa não só na execução de suas tarefas (só para a pessoa entrar na sala de aula já era algo complicado) como também comprometia no social.  A pessoa vira motivo de chacota, tachado de esquisito, fazem piadinhas sobre ele, cochichos. Como a pessoa está com suas funções mentais preservadas, ela tem consciência do que está acontecendo, mas não tem controle sobre isso, não agüenta essa situação social e se retira. Então nada mais natural do que esse ser o tema lanterninha.
E o "Diga não ao soutien infantil"   por que é disparado o mais lido? Acho que é por ser algo tão antinatural que gera espanto, choque nas pessoas. Soutien infantil, como assim? Soutien é para peitos e meninas crianças não tem peito, então o que é esse soutien infantil? E aí vem o interesse em ler algo a respeito. Curti. Procurarei fazer alguns textos que abordem esse “bizarro” social econômico. Mas, de vez em quando, a saúde mental estará presente nos meus textos já que ela faz parte do meu cotidiano reflexivo. Lido com ela todos os dias e procuro compreender e ajudar quem sofre com ela.

domingo, 1 de maio de 2011

Mãe e culpa: eterna equação



Este final de semana encontrei com uma amiga, mãe de primeira viagem, e seu bebezinho que está com quase 5 meses. Daqui há mais ou menos um mês e meio ela voltará a trabalhar e já está pesquisando berçários para deixar seu filho durante sua jornada diária de 40 horas semanais. Está muito angustiada com esse fato, disse estar sentindo culpa por ter que deixá-lo em um lugar no qual ficará por quase 10 horas, só para ela voltar a trabalhar. Disse-me que sentia vontade de continuar a cuidar dele por mais um tempo. Conta que sente o dia passar com tanta tranqüilidade, diz que o filho é muito bem humorado e faceiro, gosta de acompanhá-lo em seu desenvolvimento. E isso não são só adjetivos fantasiosos de mãe, o mocinho é uma delícia. Sorri o tempo todo,  interage, se diverte sozinho comendo o pé, esticando e dobrando as pernas, pegou no sono no meio de uma praça cheia de crianças, é tranquilão. Racionalizando: qual o sentido dela voltar ao trabalho? O que em sua rotina diária na empresa vai preenchê-la tanto? Ela sabe que vai voltar a enfrentar a competição do mundo corporativo, as reuniões intermináveis, excessos de cobranças e caixas de entrada de e-mails lotadas com e-mails que foram mandados com cópia para todo mundo (hoje é uma prática corrente nas empresas mandar cópia para todos para tirar o seu da reta rapidinho ou dedurar profissionalmente alguém rapidinho). Ou seja, voltar para um mundo que agora parece tão mesquinho, apesar dela trabalhar em uma grande empresa muito conceituada no Brasil. Só que nesse momento, nada ligado ao seu trabalho “passado” está fazendo sentido se comparado à nova vida que está vivendo. Nova vida em todos os sentidos. Ela se descobriu como mãe, descobriu o marido como pai, descobre o filho a cada dia e gosta de cuidar dele. Então, racionalmente, a resposta lógica seria ela ficar em casa por mais um tempo, certo? Não. As razões que nos levam a tomar decisões, na maioria das vezes, não têm nada haver com a lógica objetiva e sim com uma “lógica” subjetiva. O receio de ficar fora do mercado de trabalho e quando quiser voltar não ter mais espaço.  Tem receio de abandonar uma ótima empresa e ser uma insanidade (no caso da minha amiga essa empresa é o sonho de muita gente). E existem muitas outras razões subjetivas ligadas ao que se projeta para o futuro.
Por fim, o que isso tem haver com culpa? Tudo. Essa culpa, que ela está sentido e que muitas outras mães também sentem, se instala porque o que será feito é totalmente contrário ao desejo delas. No íntimo essas mães acreditam que estão abandonando seus filhos por algo fútil e sem sentido. É aí que a culpa encontra um espaço para se multiplicar, onde existe um conflito. Por isso, mães que estão com esse conflito, não deixem de acreditar que suas razões subjetivas têm um sentido sim, tanto para você como para seu filho. Não se sintam moralmente egoístas, afinal estão tentando ser mães, e conflito x culpa é uma constante na relação mães e filhos. É, foi e parece que sempre será.